Nota conjunta de organizações de Direitos Humanos contra propostas normativas que podem levar à criminalização e vigilância de movimentos sociais ao tratar de “fake news”

6 de Junho de 2020


Manifestamos publicamente nossa preocupação com os encaminhamentos em torno do Projeto de Lei nº 2.630 de 2020, de autoria do Senador Alessandro Vieira (CIDADANIA-SE), que visa instituir a Lei da Liberdade, Responsabilidade e Transparência na Internet. A votação da matéria está prevista para a próxima quarta-feira (10).  


O PL se propõe a combater as chamadas “fake news” no país, mas, sob essa promessa, ao focar na criminalização de determinados comportamentos, pode ter um efeito terrível sobre os direitos à liberdade de expressão, de imprensa e à liberdade de associação, prejudicando movimentos sociais e organizações de defesa de direitos humanos.


As diversas propostas apresentadas em torno do projeto no Senado, e outras similares protocoladas na Câmara dos Deputados, tipificam como crime condutas de maneira aberta e pouco objetiva, com potencial de enquadrar práticas cotidianas até mesmo na Lei de Organização Criminosa. Além disso, impõem a redes sociais e serviços de mensageria práticas de coleta massiva de dados pessoais, legitimando a vigilância em massa e tratando todas as pessoas que usem a Internet, mesmo sem nenhuma suspeita, como potenciais agentes de crimes e ilicitudes. Nos preocupa, portanto, que tais propostas materializem três riscos graves: 

1) coleta excessiva de dados e vigilância em massa de  cidadãos e organizações; 

2) criminalização de diversas condutas; 

3) conceitos mal formulados e genéricos que lastreiam a criminalização de atitudes.


Ressaltamos que vivemos um cenário atual de restrições diárias ao espaço cívico e democrático, em que movimentos sociais têm sido constantemente criminalizados e a legitimidade de sua atuação desrespeitada pelas mesmas instituições que deveriam zelar por direitos e garantias fundamentais. Portanto, preocupa-nos ainda mais a previsão de qualquer tipo de mudança a partir de conceitos que podem ser utilizados para vigiar, perseguir e condenar movimentos sociais e restringir o espaço cívico.


Nós, organizações signatárias da presente carta, reconhecemos a importância de se abordar o tema da disseminação de desinformação de maneira a coibir quem utiliza redes sociais e serviços de mensageria de forma organizada e em massa para violar direitos e prejudicar os regimes democráticos. Mas alertamos os Senadores Angelo Coronel e Alessandro Vieira que o conteúdo do projeto não pode, a pretexto de combater a desinformação no Brasil, abrir margem para a criminalização e vigilância de movimentos sociais e sociedade civil organizada ou para a coerção abusiva do direito à liberdade de expressão e associação. 



Assinam a presente nota:

Articulação de Organizações de Mulheres Negras Brasileiras (AMNB)

ARTIGO 19 Brasil

Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji)

Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Intersexos (ABGLT) - integrante do Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH)

Casa da Cultura Digital Porto Alegre (CCPOA)

Central de Cooperativas Unisol Brasil - integrante do Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH)

Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé

Centro Feminista de Estudos e Assessoria (CFEMEA)

Coding Rights

Comissão de Proteção de Dados e Privacidade da OAB-RJ

Conectas Direitos Humanos

Fórum da Amazônia Oriental (FAOR)

Fórum Permanente de Igualdade Racial (FOPIR)

Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC)

Informativo Dendicasa

InternetLab

Intervozes - Coletivo Brasil de Comunicação Social

Instituto Bem Estar Brasil (IBEBrasil)

Instituto βeta: Internet & Democracia (IβIDEM)

Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (IDEC)

Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc)

Instituto Igarapé

Instituto de Pesquisa em Direito e Tecnologia do Recife (IP.rec)

Instituto de Referência em Internet e Sociedade (IRIS)

Instituto Sou da Paz

Instituto Terra, Trabalho e Cidadania (ITTC)

Instituto Vladimir Herzog

Iser Assessoria

Justiça Global

Laboratório de Políticas Públicas e Internet (LAPIN)

Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) - integrante do Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH)

Movimento Camponês Popular (MCP)

Movimento Negro Unificado (MNU) - integrante do Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH)

Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST)

Odara - Instituto de Mulher Negra

Ordem dos Advogados do Brasil (OAB)

Plataforma de Direitos Humanos - DHESCA Brasil

Plataforma dos Movimentos Sociais pela Reforma do Sistema Político

Plataforma Conexão Malunga

Projeto Meninos e Meninas de Rua e Movimento Nacional de Meninos e Meninas de Rua - integrante do Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH)

Repórteres sem Fronteiras (RSF)

Rede Justiça Criminal

Terra de Direitos

Transparência Brasil

União Brasileira de Mulheres (UBM) - integrante do Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH)

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Updated on 08.06.2020