Carta aberta às autoridades brasileiras sobre a denúncia do MPF contra o jornalista Glenn Greenwald

Mais de 40 organizações defensoras dos direitos humanos e da liberdade de expressão assinam uma carta aberta dirigida às autoridades brasileiras para condenar a denúncia oferecida pelo Ministério Público Federal (MPF) contra o jornalista Glenn Greenwald. A ação foi mobilizada pela Repórteres sem Fronteiras e a Freedom of the Press Foundation. As acusações por parte do MPF ainda deverão ser analisada por um juiz federal, dando uma oportunidade ao judiciário de rejeitá-la e assegurar a liberdade de imprensa. Ainda assim, o efeito dissuasivo que gera esse tipo de intimidação permanece. Ao se permitir que essa estratégia prevaleça, se coloca em risco a liberdade de expressão, a liberdade de imprensa e a liberdade de participação democrática.

24 de janeiro de 2020


Para:

Presidente da República, Jair Bolsonaro 

Presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia 

Presidente do Senado, David Alcolumbre

Presidente do Supremo Tribunal Federal, José Antonio Dias Toffoli


Cc:

Procurador Geral da República, Augusto Aras 

Corregedora Geral do MPF, Elizeta Maria de Paiva Ramos 

Procuradora Federal dos Direitos dos Cidadãos, Deborah Duprat 


As organizações signatárias, defensoras da liberdade de imprensa e dos direitos civis, condenam enfaticamente a denúncia oferecida pelo Ministério Público Federal (MPF) contra o renomado jornalista investigativo Glenn Greenwald.


Estas representam uma clara tentativa de intimidação e retaliação contra Glenn Greenwald e o The Intercept Brasil, em decorrência da publicação de uma série de reportagens com base em mensagens que aparentam indicar a colaboração entre um procurador e o juiz responsável por julgar os crimes identificados pela força-tarefa da Operação Lava Jato. Ao acusar Glenn Greenwald de ter cometido crimes digitais, o Ministério Público Federal (MPF) essencialmente criminaliza práticas legítimas relativas ao exercício jornalístico, inibindo simultaneamente jornalistas e suas fontes.


A denúncia apresentada no dia 21 de janeiro de 2020 pelo Ministério Público Federal (MPF) é apenas o mais recente episódio de uma extensa campanha para perseguir e desacreditar os jornalistas cobrindo o tema. Eles foram alvo de diversas ameaças desde junho de 2019, quando o The Intercept Brasil começou a reportar sobre o conteúdo das mensagens trocadas por autoridades públicas pelo aplicativo Telegram, obtidas por uma fonte anônima. Uma coalizão de 29 organizações defensoras da liberdade de expressão e dos direitos humanos publicou um chamado internacional em julho de 2019 para denunciar essas ameaças contra os jornalistas do The Intercept Brasil. Naquele momento, assim como agora, o alcance desses ataques transcende a figura de Glenn Greenwald e de seus colegas, e impacta a liberdade de imprensa no Brasil como um todo.


Os ataques contra Glenn Greenwald e o The Intercept Brasil incluem ameaças de morte, desinformação e um processo criminal. Vale destacar que uma investigação foi interditada em agosto de 2019, por uma decisão liminar de um ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), na qual afirma que a iniciativa poderia "configurar inequívoco ato de censura”, em violação da Constituição Federal.


O direito de jornalistas reportarem com base em fontes primárias que evidenciam irregularidades cometidas por autoridades públicas é um aspecto crucial da liberdade de imprensa. O Ministério Público Federal (MPF) abusou do seu poder ao acusar Glenn Greenwald de exercer essa atividade - apesar da conclusão da Polícia Federal publicada em um relatório em dezembro de 2019, afirmando não haver evidências de que o jornalista tenha cometido qualquer tipo de crime relacionado ao vazamento das mensagens.


Considerando a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) e as conclusões apresentadas pela Polícia Federal, a presente denúncia oferecida pelo Ministério Público Federal (MPF) de que Glenn Greenwald teria conspirado com sua fonte anônima é injustificável.


A denúncia será analisada por um juiz federal, dando uma oportunidade ao judiciário de rejeitá-la e assim assegurar a liberdade de imprensa. Ainda assim, o efeito dissuasivo que gera esse tipo de intimidação permanece. Ao se permitir que essa estratégia prevaleça, se coloca em risco a liberdade de expressão, a liberdade de imprensa e a liberdade de participação democrática.


Atenciosamente,


Freedom of the Press Foundation* 

Reporters Without Borders 

Access Now 

Agência Pública

American Civil Liberties Union 

ARTICLE 19 Brazil and South America 

Asociación por los Derechos Civiles 

Association for Progressive Communications (APC) 

Brave New Films 

Brazilian Association of Investigative Journalism (Abraji) 

CODEPINK 

Columbia Journalism Review 

Committee to Protect Journalists 

Cooperativa Tierra Común 

Demand Progress 

Derechos Digitales 

Doc Society 

Electronic Frontier Foundation (EFF) 

ExposeFacts 

Fundación Acceso (Costa Rica) 

Fundación Ciudadania Inteligente

Fundación Datos Protegidos (Chile) 

Fundación Karisma 

Fundación Huaira (Ecuador)

Fundación Vía Libre

Human Rights Watch 

IFEX 

IFEX-ALC 

IPANDETEC Centroamérica 

Instituto Vladimir Herzog 

International Press Institute 

Intervozes

National Federation of Brazilian Journalists (FENAJ)

Newscoop

Observatório da Imprensa

Pen International

Reporters Committee for Freedom of the Press 

Roots Action 

Sursiendo CCD 

TEDIC

The Guardian

Ubunteam Community 

Usuarios Digitales 

World Association of News Publishers 

Witness 

Publié le
Updated on 27.01.2020