Sobre o Programa de Proteção aos Defensores de Direitos Humanos, Comunicadores e Ambientalistas (PPDDH) – Brasil
- Sobre o Programa de Proteção aos Defensores de Direitos Humanos, Comunicadores e Ambientalistas (PPDDH) – Brasil
- Sobre o mecanismo
- Medidas oferecidas
- Como acessar
- Do pedido à execução das medida
- Desafios
- Perguntas frequentes
- Mais informações
Os mecanismos de proteção são programas implementados dentro da estrutura do Estado para responder a uma violência estrutural contra determinados grupos. Na maioria dos casos, eles são o resultado de pressões da sociedade civil e de organizações internacionais, que reivindicam medidas de proteção que garantam a integridade das pessoas ameaçadas em decorrência da sua atividade.
Essencialmente, os mecanismos recebem as denúncias de ameaças, realizam uma avaliação de risco, deliberam sobre a necessidade e os tipos de medida a serem adotados, implementam um esquema de proteção e acompanham a pessoa beneficiária, que passa a estar oficialmente sob proteção do Estado. As medidas podem variar de rondas policiais regulares e utilização de escoltas, carros blindados e coletes à prova de balas, até a realocação do/a beneficiário/a para outra cidade.
Sobre o mecanismo
O Programa de Proteção aos Defensores de Direitos Humanos, Comunicadores e Ambientalistas (PPDDH) foi lançado em 2004. O objetivo é garantir segurança para que esses três grupos continuem exercendo suas atividades no local de atuação, salvo nos casos em que isso agrave o risco à sua integridade física.
Jornalistas e comunicadores/as foram incluídos oficialmente no PPDDH apenas em 2018. A proteção é oferecida somente àqueles/as que atuam “para disseminar informações que objetivem promover e defender os direitos humanos e que, em decorrência da atuação nesse objetivo, estejam vivenciando situações de ameaça ou violência que vise a constranger ou inibir sua atuação nesse fim”.
Essa restrição contraria os padrões internacionais de proteção à liberdade de expressão, condicionando o direito a participar do programa ao tipo de conteúdo produzido pelo jornalista/comunicador.
E, apesar de o Brasil ser o segundo país da América Latina com mais assassinatos de jornalistas na última década, atrás apenas do México, o PPDDH não responde plenamente às necessidades dos/as comunicadores/as. Em julho de 2022, apenas 6 dos 650 beneficiários da política pública atendidos no território nacional pertenciam a este grupo.
Medidas oferecidas prioritariamente
As mais comuns são orientações de autoproteção e apoio psicológico e articulações para dar visibilidade aos casos, por meio da promoção de mesas de diálogo e reuniões. O PPDDH prevê ainda o acompanhamento de inquéritos, denúncias e processos e o monitoramento periódico da atuação do/a beneficiário/a, a fim de avaliar a persistência do risco e da situação de ameaça.
A partir dessa análise, verifica-se a necessidade de adoção de medidas de segurança mais intensa, como rondas, escoltas e disponibilização de equipamentos de segurança como câmeras e circuito fechado de TV, que então são solicitadas aos órgãos de segurança pública do estado de residência do jornalista.
Outra medida possível, em casos extremos, é o acolhimento provisório, que permite a retirada temporária do/a beneficiário/a de sua cidade, para redução do risco imediato.
A atual gestão do Programa declara garantir uma “proteção simbólica” aos/às comunicadores/as ameaçados/as, entendendo que basta integrar formalmente o PPDDH para que os/as defensores/as estejam protegidos/as.
Como acessar o PPDDH
O primeiro passo é preencher o formulário de solicitação de inclusão e enviá-lo à Coordenação-Geral de Proteção à Testemunha e aos Defensores de Direitos Humanos da pasta de Direitos Humanos do Executivo federal.
O pedido de inclusão pode ser feito pelo/a próprio/a jornalista ou comunicador/a, por qualquer organização da sociedade civil, indivíduo ou grupo de indivíduos, órgão público ou movimento social.
São solicitadas informações de identificação e contato da pessoa ameaçada, seu histórico na promoção e defesa de direitos humanos e um breve relato do contexto das ameaças recebidas. Para comprovar as informações e a situação de risco, é recomendável anexar Boletim de Ocorrência, Termo de Atendimento do Ministério Público, fotos, mensagens de Whatsapp, áudio, vídeos, entre outros.
As informações também podem ser enviadas por e-mail para [email protected]. Ou por carta, para: Secretaria Nacional de Proteção Global – SNPG, Coordenação Geral de Proteção a Testemunhas e Defensores de Direitos Humanos - CGPTDDH. Setor Comercial Sul - B, Quadra 9, Lote C Edifício Parque Cidade Corporate, Torre A, 9º andar Brasília – Distrito Federal – 70308-200.
Organizações da sociedade civil, como a RSF, se dispõem a acompanhar o processo de solicitação.
A porta de entrada no PPDDH acontece nos estados, no caso daqueles onde o programa tem atuação local (Bahia, Ceará, Maranhão, Mato Grosso, Minas Gerais, Paraíba, Pará, Pernambuco, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul), ou via uma equipe federal em Brasília, que atende a defensores e jornalistas peticionários residentes nos demais estados da federação. Nos dois casos, a execução da política é feita por organizações da sociedade civil conveniadas, o que diferencia o PPDDH dos demais mecanismos de proteção na América Latina.
A decisão sobre a inclusão de casos e medidas a serem ofertadas é feita pelo Conselho Deliberativo (Condel), com base em um parecer realizado pela equipe técnica. Dentre os elementos considerados estão o perfil da pessoa atendida (gênero, idade, local de moradia), o perfil do agressor, redes de apoio disponíveis, possibilidades de articulação com o poder público local, origem e motivação das ameaças.
Até hoje, entretanto, não há uma metodologia específica para análises de risco de comunicadores e jornalistas.
No caso do programa federal, responsável pelos estados onde não há atuação local do PPDDH, o Conselho Deliberativo é composto por 9 assentos, dos quais 3 são destinados à sociedade civil. Os demais são destinados à pasta de Direitos Humanos do Executivo federal (2), ao Ministério da Justiça e Segurança Pública (2), à Fundação Nacional do Índio (Funai) e ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra). A previsão é de reuniões bimestrais.
A proteção é oferecida geralmente por dois anos e está sujeita a renovação, se persistirem as ameaças.
Do pedido à execução das medidas
Pelo site, por e-mail ou carta. Informações requeridas inicialmente: nome, contato, breve histórico de atuação, relato e comprovação de ameaças.
Esta etapa só ocorre nos casos em que é identificado nexo de causalidade entre as atividades do solicitante e a ameaça relatada. A partir daí, a equipe do PPDDH entra em contato para apresentação do Programa e das medidas protetivas possíveis. O/A solicitante é questionado/a sobre sua voluntariedade em ingressar no Programa, suas expectativas, os registros das últimas ameaças e possíveis demandas emergenciais.
Havendo, no primeiro contato da equipe técnica, a constatação da necessidade de medidas urgentes de proteção à integridade física, elas podem ser aprovadas em caráter provisório e são implementadas em articulação com a Secretaria de Segurança Pública do estado em que vive o/a peticionário/a.
São agendadas conversas do/a jornalista com profissionais da equipe técnica, que também dialoga com órgãos públicos, organizações da sociedade civil reconhecidas na região e pessoas próximas do peticionário para elaborar um parecer com possíveis cenários de ocorrência de agressões. Este documento traz hipóteses e possibilidades de risco e as estratégias de intervenção necessárias. Esta etapa leva, no mínimo, 2 meses.
O parecer é apresentado pela equipe técnica na reunião do Condel, que decide pela inclusão ou não do caso e elabora, em diálogo com o/a beneficiário/a, o Plano de Ação Protetiva. O plano é reavaliado a cada três ou seis meses, a depender da situação de risco do/a jornalista.
Casos que apresentam risco acentuado são acompanhados por organizações policiais no território de atuação do/a jornalista, por meio de rondas ou, quando necessário, escoltas. A decisão sobre a renovação das medidas protetivas é tomada pelo Conselho Deliberativo, a partir de parecer das equipes técnicas.
Desafios
- Menos da metade dos estados brasileiros possui estrutura própria para atendimento dos casos, e falta integração entre as equipes estaduais e a federal.
- A predominância de medidas de articulação e acompanhamento institucional, em detrimento de medidas concretas de proteção, não responde à necessidade de boa parte dos jornalistas e defensores/as.
- No caso do programa federal, o acompanhamento dos casos é feito à distância, o que fragiliza o beneficiário/a.
- Faltam ações de comunicação e busca ativa para aproximar o PPDDH de jornalistas e comunicadores/as. Muitos/as sequer sabem da existência da política pública.
- Também não há enfoques diferenciados de gênero, raça, etnia, diversidade sexual e outras para o tratamento dos/as beneficiários/as.
- A desconfiança dos/as possíveis beneficiários/as em relação ao Estado, às forças de segurança e ao PPDDH também dificulta a efetividade da política pública.
- O modelo de convênio com organizações da sociedade civil pode gerar atraso no repasse de recursos, prejudicando a continuidade da política e pode colocar beneficiários em risco.
- O Plano Nacional de Proteção aos Defensores, previsto desde 2007, nunca saiu do papel.
Perguntas frequentes
O Manual de Procedimentos do PPDDH entende por violação “toda e qualquer conduta atentatória à atividade pessoal ou institucional do defensor dos Direitos Humanos ou de organização e movimento social que se manifeste, ainda que indiretamente, sobre familiares ou pessoas de sua convivência próxima, dentre outras formas, pela prática de crimes tentados ou consumados, tais como homicídio, tortura, agressão física, ameaça, intimidação, difamação, prisão ilegal ou arbitrária, falsa acusação, além de atentados ou retaliações de natureza política, religiosa, econômica, cultural, de origem, de etnia, de gênero, de orientação sexual, de cor e raça, de idade, dentre outras formas de discriminação, desqualificação e criminalização de sua atividade que ofenda a sua integridade física, psíquica ou moral, a honra ou o seu patrimônio”.
O PPDDH considera ameaça “toda e qualquer conduta atentatória que tenha como objetivo impedir a continuidade de sua atividade pessoal ou institucional e que se manifeste, ainda que indiretamente, sobre sua pessoa ou familiares”. O conceito abrange atentados contra a integridade física, psíquica, moral ou econômica, e atos de caráter discriminatório de qualquer natureza.
Sim. Organizações da sociedade civil especializadas no tema vêm buscando sensibilizar gestores do Programa para adoção de uma concepção mais ampla de direitos humanos, em consonância com os padrões internacionais, enfatizando a importância da liberdade de expressão e da liberdade de imprensa para a democracia. Ao solicitar inclusão no Programa, procure descrever os impactos do seu trabalho e das informações que você publica para o conjunto da população ou para grupos específicos – por exemplo, em situação de vulnerabilidade. Cabe ressaltar que o pedido só será aceito se for comprovada a relação entre a situação de ameaça e seu trabalho como jornalista/comunicador.
Sim. O Disque 100 é o serviço de denúncias de violações da Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos. Ele está disponível 24 horas e a ligação é gratuita. O objetivo é atender a graves violações que acabaram de ocorrer ou que estão em curso, agilizando o contato com os órgãos competentes e possibilitando o flagrante. Comunicadores e jornalistas estão entre os grupos atendidos por esse serviço.
Um caminho alternativo, mas que não se aplica a casos de emergência, é acionar a Rede Nacional de Proteção a Jornalistas e Comunicadores. Coordenada pelo Instituto Vladimir Herzog e apoiada pela RSF, a Rede possui um canal de recepção de denúncias de ameaças e ataques à liberdade de expressão. Oferece ainda orientações sobre estratégias de autoproteção e analisa o encaminhamento do caso em outras frentes, sempre em parceria com a vítima.
Mais informações
Entre 2021 e 2022, a RSF pesquisou e analisou a situação dos mecanismos de proteção a jornalistas nos quatro países mais perigosos para a imprensa na América Latina: México, Honduras, Colômbia e Brasil.
O relatório “Sob Risco – Como superar as falhas dos programas de proteção a jornalistas na América Latina” avalia o funcionamento, a eficácia e o impacto de medidas de proteção adotadas para acolher jornalistas ameaçados/as e que solicitam apoio do Estado.
O material, publicado em fevereiro de 2022, é baseado em 75 entrevistas realizadas pela RSF com beneficiários/as, responsáveis pela implementação dos mecanismos de proteção e representantes de organizações da sociedade civil. O resumo executivo do relatório sintetiza as conclusões do estudo.
Cobrar que o Estado cumpra sua obrigação é apenas parte do desafio de aprimorar a proteção dos comunicadores. Da mesma forma, a segurança não pode ser vista apenas como compromisso individual do/a jornalista, mas de todas as empresas, organizações sociais e coletivos que produzem comunicação.
Para mais informações, acesse o Guia de Segurança de Digital (em português) e a Guía práctica para periodistas en zonas de riesgo (em espanhol), da RSF.