RSF põe em causa detenção de jornalista após publicação de informações sobre ataques informáticos

05/03/2015 - O fundador de TugaLeaks em liberdade até ao julgamento, mas sem acesso à Internet

Rui Cruz, detido a 26 de fevereiro de 2015 no âmbito de uma investigação sobre ataques informáticos, foi libertado no dia seguinte após ter prestado declarações e aguardará o julgamento em liberdade. Como medidas de coacção, a justiça decretou que o jornalista terá de se apresentar quinzenalmente na esquadra da sua zona de residência. Para além disso, foi-lhe proibido o acesso à Internet, assim como a compra de material informático e a assinatura de contratos com provedores de serviços de Internet.

Rui Cruz foi constituído arguido pelos crimes de “acesso ilegítimo”, “sabotagem informática” e “acesso indevido”. A investigação acusa-o de ter apoiado os ciberataques, especialmente ao ter publicado informações sobre os actos de pirataria em primeira mão e, por vezes, antes dos próprios hackers os divulgarem nas redes sociais.

No TugaLeaks, Rui Cruz criticava as falhas de segurança dos sistemas informáticos de vários organismos públicos reveladas pelos hackers. Os seus artigos, embora possam ter aumentado a notoriedade dos piratas, procuravam responder à missão jornalística de partilhar com os seus leitores informações de interesse público.

Na sequência da sua detenção e posterior imputação, Rui Cruz perdeu o emprego de consultor numa empresa de telecomunicações que conciliava com as suas actividades no TugaLeaks. Devido à proibição de acesso à Internet, o site de informação não poderá ser actualizado pelo seu único responsável e corre o risco de desaparecer.

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O jornalista Rui Cruz foi detido a 26 de fevereiro de 2015 no âmbito de uma investigação da Polícia Judiciária (PJ) sobre sabotagem informática. Repórteres sem Fronteiras (RSF) considera preocupante que um jornalista possa ter sido preso por ter revelado a existência destes ataques.

Rui Cruz é o fundador e responsável do site de informação TugaLeaks, sediado no seu domicílio no Pinhal Novo, nos arredores de Lisboa. O jornalista foi detido e a sua residência alvo de buscas na manhã do dia 26 de fevereiro. Os motivos específicos da detenção são ainda desconhecidos. Rui Cruz será ouvido no dia 27 de fevereiro por um juiz do Tribunal de Instrução Criminal de Lisboa. Numa conferência de imprensa, Carlos Cabreiro, coordenador de investigação criminal da PJ, declarou que o sítio de informação é acusado de “divulgar um conjunto de dados relativos à prática de crimes informáticos”. Também indicou que um representante do Sindicato dos Jornalistas esteve presente no momento da detenção, como previsto pela lei.

TugaLeaks revelou em vários artigos exclusivos uma série de ataques informáticos realizados desde Abril de 2014 por grupos de hackers portugueses, pertencentes à rede internacional Anonymous, contra várias instituições públicas e empresas privadas. Entre as entidades afectadas contam-se a EDP, o Banco de Portugal e o Banco Espírito Santo (BES), o Ministério Público e a Comissão da Carteira Profissional de Jornalista. Na sequência destas duas últimas acções, milhares de dados pessoais de procuradores e jornalistas foram divulgados pelos hackers.

Nos seus artigos, TugaLeaks fornecia links para as páginas e os dados pirateados, colocados em sites de partilha de ficheiros. A página de informação online também cobria habitualmente problemas nos serviços públicos na região de Lisboa.

Repórteres sem Fronteiras relembra que a divulgação de actos supostamente ilegais não constitui por si só um delito passível de detenção.

Seis outro suspeitos foram detidos no dia 26, acusados de “sabotagem informática (DDoS)”, “dano informático (defacing)”, “acesso ilegítimo” e “exfiltração de dados”.

Portugal situa-se no 26º lugar, entre 180 países, da Classificação Mundial la Liberdade de Imprensa estabelecida por Repórteres sem Fronteiras.

(photo : foto DR, jn.pt)

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Updated on 16.10.2016