Ataques contra a imprensa persistiram até o dia da votação em 1o turno

A reta final do 1o turno das eleições brasileiras seguiu marcada por tentativas de intimidação e ataques ao jornalismo. Entre os dias 26 de setembro e 02 de outubro, dia da votação, a Repórteres sem Fronteiras (RSF) registrou 28.409 postagens com conteúdos ofensivos à imprensa nas redes sociais.

Nesse período, pelo menos 59 hashtags direcionando ataques a veículos de comunicação e jornalistas foram utilizadas. A #GloboLixo, que foi a mais frequente em todo o período de campanha no primeiro turno, foi utilizada ao menos 13.117 vezes, normalmente acompanhada de outras como #bolsonaronoprimeiroturno e #bolsonaroreeleitoem2022. A prática demonstra a relação entre quem usa a hashtag para agredir a imprensa e o apoio à candidatura de Jair Bolsonaro. Outras hashtags relevantes na semana foram: #globolixoderretendo (438), #cnnlixo (230) e #folhalixo (118).

O principal evento jornalístico da semana anterior à votação, o debate entre candidatos à presidência promovido pela TV Globo, no dia 29, fomentou a maior parte das postagens ofensivas. Além das já frequentes hashtags de ataque ao Grupo Globo, também entraram na lista das mais mencionadas nos perfis monitorados pelo projeto #acabouamamata (com 118 menções) e #boinner (com 109). A primeira se refere à declaração de Bolsonaro durante o debate de que teria “acabado com a mamata da Rede Globo”, ao reduzir os montantes de publicidade governamental destinados à emissora. A segunda é um ataque direto ao apresentador e mediador do debate, William Bonner.

O grafo mostra as principais hashtags ofensivas à imprensa e outras frequentes compartilhadas conjuntamente, como #bolsonaronoprimeiroturno, #bolsonaroreeleitoem2022 e #debatenaglobo.

Alvos da semana

Nessa semana, os jornalistas que mais receberam postagens ofensivas e intimidadoras foram: Miriam Leitão (1.298); Eliane Cantanhêde (1275); Mônica Bergamo (683); Ricardo Noblat (566); Reinaldo Azevedo (514); Vera Magalhães (488); Rachel Sheherazade (444); Andréia Sadi (413); Guga Chacra (395); e Milton Neves (378).

O grafo mostra os jornalistas mais atacados na semana de 29 de setembro a 02 de outubro.

Miriam Leitão recebeu muitos ataques nos dias 29 de setembro, data do debate na TV Globo, e 02 de outubro, dia das eleições. Vários deles eram relacionados a questionamentos sobre a veracidade das pesquisas eleitorais. O tom geral, para além das agressões mais diretas, foi de descredibilização do conteúdo publicado pela jornalista. Nas agressões a Miriam Leitão, também são muito comuns montagens que modificam o rosto e zombam da profissional.
 

Imagens que agridem

A reprodução orquestrada de imagens e vídeos em conexão com hashtags ofensivas à imprensa também se tornou recorrente no primeiro turno da campanha eleitoral. Com grande potencial de viralização, este tipo de material pode aumentar o impacto das postagens agressivas. Na semana pré-eleições, tais imagens procuravam descredibilizar a jornalistas e veículos, atrelando o trabalho da imprensa a uma suposta “conspiração” em apoio ao candidato Lula da Silva, principal oponente do presidente Bolsonaro.

O grafo mostra as principais imagens que circularam no Twitter ligadas às hashtags de ataque contra a imprensa no período de 29 de setembro a 2 de outubro.

Numa delas, as jornalistas Vera Magalhães e Miriam Leitão são retratadas como cobras ao lado de candidatas, supostamente submetidas ao “encantamento” do candidato Lula, que aparece segurando uma garrafa de cachaça. Na principal postagem que reproduzia a imagem nesta semana de monitoramento, o autor atacou Miriam Leitão: “Entrevista é igual debate?! Sua militante disfarçada de jornalista!”.

Imagem ridicularizando as jornalistas Vera Magalhães e Miriam Leitão, além de candidatas mulheres.

O perfil das contas agressoras

As principais contas que utilizaram as hashtags de ataques a jornalistas e veículos de imprensa na semana foram: @medicinaupap, @bolsopatriota22, @mitags, @sdc_alemao, @cleytonluisss. Nessa reta final de primeiro turno, esses perfis estiveram bastante dedicados a compartilhar materiais de campanha de Bolsonaro e a reforçar eixos centrais de seu discurso político. Chama a atenção a atividade do perfil @medicinaupap, que se identifica como médico e militar. Ele realizou ao menos 3.237 postagens ofensivas à imprensa somente na semana que antecedeu o dia das eleições. Na média, são mais de 460 postagens por dia - cerca de 20 por hora, uma a cada 3 minutos, consideradas as 24 horas do dia.

Já o perfil de Jair Bolsonaro repercutiu sua participação no debate da TV Globo. Uma postagem direcionada contra a empresa teve alcance de 11.035.385 perfis.

Outro perfil que se destacou na semana foi o de Leandro Ruschel, um dos mais importantes influenciadores bolsonaristas das redes sociais. Uma de suas postagens direcionada à jornalista Eliane Cantanhêde teve alcance de 893.173 perfis. Outra, crítica à Globo e à jornalista Natuza Nery, chegou a 903.455 perfis. 

Sobre o projeto

Durante as eleições (16 de agosto a 30 de outubro), a Repórteres sem Fronteiras realiza um monitoramento sistemático das redes sociais, em particular do Twitter, para analisar e decifrar o alcance e os padrões por detrás dessa hostilidade crescente contra o jornalismo. Até o final do segundo turno, 120 jornalistas e comentaristas, além de perfis de autoridades públicas e candidatos às eleições, serão acompanhadas diariamente em parceria com o Laboratório de Estudos sobre Imagem e Cibercultura (Labic) da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES), centro de pesquisa de referência especializado em análise de redes sociais e tendências digitais. 

A RSF publica análises semanais com base nos levantamentos realizados, que estão compilados nesta página.

 

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